terça-feira, 19 de julho de 2016

PARA ENTENDER O QUE ACONTECEU EM NICE, FRANÇA



O artigo abaixo foi originalmente publicado na Folha de São Paulo e é de autoria de Mathias Alencastro. Ele nos ajuda a compreender que a violência, de qualquer tipo, gera apenas mais violência. E a consequente falta de justiça, gera mais violência ainda.

Acirramento recente faz da França alvo de terroristas

Para entender a razão pela qual a França é hoje o principal alvo de terroristas, é preciso recapitular as últimas décadas. Ao contrário do que a história recente sugere, a integração muçulmana na França foi em geral pacífica.

Após a morte de Malik Oussekine, em 1986, franco-argelino jogado no Sena por militantes de extrema-direita, 200 mil pessoas em 36 cidades francesas manifestaram seu repúdio ao assassinato.

Desse episódio nasceu o movimento SOS Racisme, braço ativista do governo de François Mitterrand e plataforma de lançamento para políticos de origem magrebina.

Porém, depois da primeira onda de atentados terroristas islâmicos cometidos em julho e outubro de 1995 pelo Grupo Islâmico Armado, da Argélia, as tensões intercomunitárias se agravaram.

Um fator tido como fundamental nessa evolução foi o desaparecimento do chamado "cinturão vermelho" da periferia parisiense. As políticas públicas de inclusão diminuíram com o declínio dos partidos de esquerda e o avanço eleitoral da extrema-direita. O filme "O Ódio" (1995), dirigido por Mathieu Kassovitz, retrata a banalização da violência no subúrbio de Paris.

Nos anos 2000, as tensões comunitárias assumiram dimensão nacional, com a passagem ao segundo turno do candidato de extrema-direita Jean-Marie Le Pen nas eleições presidenciais de 2002 e os motins nas periferias das grandes cidades francesas em 2005. Nicolas Sarkozy foi eleito presidente em 2007 prometendo "lavar com Kärcher (uma marca de lava-jato)" as periferias francesas.

A intensificação da agenda securitária durante o governo Sarkozy levou a uma explosão do número de muçulmanos encarcerados. Segundo relatório publicado em 2014, mais de 60% dos detentos na França são muçulmanos.

Uma desproporção patente, dado que a população muçulmana do país não supera 12%. Em 2000, a proporção de muçulmanos presos não chegava à metade.

Nesse contexto, a França virou terreno fértil para o recrutamento de terroristas pelo Estado Islâmico.

Ainda não se conhece as motivações do autor do massacre de Nice, mas todos os outros terroristas envolvidos em atentados nos últimos dois anos compartilham a mesma trajetória.

Oriundos da periferia das grandes cidades francesas, tornaram-se delinquentes de crime comum depois de anos de fracasso escolar e trabalhos precários, antes de se radicalizarem sob a influência de presos islamitas atuando dentro do sistema carcerário.

Com o ataque em Nice, capital do departamento com o maior número de eleitores de extrema-direita, mesmo sem comprovação de vínculo direto, o Estado Islâmico caminha para seu objetivo maior: assombrar os franceses com o fantasma de uma guerra civil.

Um dos livros mais vendidos do ano passado, "Submissão", de Michel Houellebecq, imagina uma França governada por um muçulmano.

A questão muçulmana na França será abordada explicitamente em 2017. No contexto de tensão após a maior série de atentados da história, a situação pode piorar.

Mathias Alencastro é doutor em Ciência Política pela Universidade de Oxford e mestre em História pela Universidade Sorbonne-Paris IV.

O artigo original poderá ser visto por meio do seguinte link:


Que Deus abençoe a todos.

Alexandros Meimaridis

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