sábado, 15 de abril de 2017

CRISTÃOS COPTAS SOFREM ATAQUES COM 44 MORTOS E CENTENAS DE FERIDOS


Cristãos no Egito

Cristãos no Egito: Em Borg El-Arab, cidade vizinha a Alexandria, cristãos fazem procissão em homenagem às vítimas do terror

Os coptas são um grupo de cristãos egípcios que surgiu ainda durante o século I. O material abaixo foi publicado pelo site da Revista CartaCapital e é da autoria de José Antônio Lima.

Não há luz no fim do túnel para os cristãos coptas no Egito
Por mais brutais que sejam, os ataques do Estado Islâmico em Alexandria e Tanta são apenas uma amostra da situação dramática dos coptas
José Antonio Lima

Durante a chamada Primavera Árabe, cenas de cristãos e muçulmanos protestando juntos no Cairo, a capital do Egito, e se protegendo mutuamente das forças de segurança, causaram comoção no mundo. A esperança daqueles dias de 2011 há muito se tornou uma lembrança saudosa para quase todos os egípcios, mas as minorias, entre as quais os cristãos coptas são a mais numerosa, sofrem de maneira desproporcional. Seis anos depois do levante contra Hosni Mubarak, a comunidade copta é vítima de níveis de violência sem precedentes em sua história.

No Domingo de Ramos (9 de abril), uma das datas preparatórias para a Páscoa cristã, os coptas sofreram um ataque de grande repercussão. A igreja de São Jorge, em Tanta (100 km ao norte do Cairo), e a catedral de São Marcos, em Alexandria, foram alvo de ataques simultâneos, que deixaram 44 mortos e centenas de feridos.

O atentado terrorista foi reivindicado pelo Estado Islâmico. Ativo na Península do Sinai, o ISIS, como também é conhecido o grupo, age no Egito da mesma forma que faz na Síria e no Iraque. Ataca o governo, mas também as minorias religiosas.

O atentado provocou condenações internacionais, em especial no Ocidente. Há pouco, entretanto, que europeus e norte-americanos podem fazer pelos cristãos egípcios enquanto sua política externa apoiar o autoritarismo no Oriente Médio.

A igreja copta, uma denominação da ortodoxia oriental que teria sido fundada pelo apóstolo Marcos, existe desde o século I. Essa comunidade cristã, que hoje compõe cerca de 10% da população egípcia, sobreviveu ao Império Bizantino, à conquista muçulmana do que hoje é o Egito e experimentou seu momento mais próspero durante a dinastia de Muhammad Ali (1805-1952), na qual o Egito moderno foi fundado.

No século XIX e na primeira metade do século XX, os coptas exerceram papéis de destaque na política e na sociedade egípcias. Era um período no qual o cristianismo e o islã conviviam de forma harmoniosa. No levante nacionalista contra o Império Britânico, em 1919, por exemplo, imãs oraram em igrejas e padres realizaram celebrações em mesquitas, em uma prova de solidariedade local contra os invasores. Os ventos mudaram quando a monarquia foi derrubada no golpe que levou Gamal Abdel Nasser ao poder. A partir de 1952, os coptas foram marginalizados pelo Estado, uma situação que se agravou em 1970, quando o pan-arabista Nasser foi substituído por Anwar al-Sadat.

Em Borg El-Arab, mulheres choram durante funeral de vítimas da catedral de São Marco (Foto: Mohamed El-Shahed / AFP)

Em Borg El-Arab, mulheres choram durante funeral de vítimas da catedral de São Marco (Foto: Mohamed El-Shahed / AFP)

A ascensão de Sadat coincidiu com o empoderamento dos islamistas, os adeptos do islã político, uma ideologia segundo a qual o islã pode e deve resolver todos os problemas da sociedade. A intenção de Sadat era fortalecer os religiosos para contrapor o peso dos socialistas apoiadores de Nasser. Esta política, associada ao ganho de poder político e econômico por parte da Arábia Saudita naquele período, e ao intercâmbio entre islamistas sauditas e egípcios, foi uma das molas propulsoras da radicalização do islã no Oriente Médio.

O Egito foi um dos países que mais sofreu com a radicalização e os coptas, em particular, se tornaram um alvo primordial. Com Hosni Mubarak (1981-2011), o Egito se transformou no principal exemplo do processo que Peter Demant chama de “acomodação de determinadas exigências das populações e dos islamistas por meio de uma democratização limitada”.

Pressionado por forças políticas e sociais radicalizadas, o governo cede a extremistas religiosos em assuntos que são caros a esses (como por exemplo, a forma de lidar com uma minoria religiosa) para manter o controle sobre a sociedade. Este é um processo comum em todo o Oriente Médio. Partidos políticos, sindicatos, entidades estudantis e outras associações são fracas ou não existem. As mesquitas, entretanto, estão sempre disponíveis e muitas vezes lideradas por radicais.

Este ciclo de autoritarismo e radicalização religiosa provoca o crescimento e a legitimação de uma tendência fundamentalista, que gera uma “islamização rastejante da sociedade, cuja tendência política é antidemocrática ou pelo menos antiliberal”, como também afirma Demant. É o caldo político, social e cultural no qual viceja o jihadismo. É de onde o Estado Islâmico retira suas forças, ao se postar como único e legítimo defensor dos muçulmanos contra os regimes autoritários e "infiéis" de Sissi.

Em um contexto no qual a força dominante é o Estado autoritário e em que a principal contestação vem do islã político (islamismo), a única escolha dos coptas é buscar alguma proteção no Estado, ainda que este seja o promotor de uma discriminação sistemática que gere em muitos cristãos a sensação de serem cidadãos de segunda classe. Esta complexa realidade ficou evidente após a Primavera Árabe.

A abertura política pós-Mubarak catapultou a Irmandade Muçulmana e os salafistas (ambos islamistas, de diferentes vertentes) para um papel de proeminência na política egípcia. Em 2013, após um ano de presidência da Irmandade Muçulmana, veio o golpe liderado por Abdel Fattah al-Sissi. Muitos coptas apoiaram a nova ditadura.

Quase quatro anos depois, o apoio minguou. Parte significativa da atuação de Sissi é perseguir o islã político em todas as suas formas, onde for possível. Em um único dia de agosto de 2013, seu regime assassinou cerca de mil irmãos muçulmanos a luz do dia, no Cairo, em uma carnificina comparável ao Massacre da Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 1989. Ações como essa exacerbaram a violência sectária no Egito, ampliando a vulnerabilidade da comunidade copta, uma vez que o Estado, preocupado em garantir a existência do regime, é incapaz de proteger seus cidadãos.

Coptas

Coptas
Coptas fazem celebração em igreja incendiada em Minya, em julho de 2016 (Foto: Twitter / @copticulture)

Desde 2013, inúmeras igrejas foram vandalizadas, mas as comunidades cristãs não receberam autorização para repará-los. O Estado prometeu se responsabilizar por isso, mas jamais levou a promessa a cabo. Muitos templos seguem em ruínas e os coptas também não conseguem erguer novas igrejas.

O processo de autorização é burocrático a ponto de, na prática, inviabilizar o surgimento de novos templos cristãos. Uma nova lei aprovada no governo Sissi deveria corrigir isso, mas acabou dando ainda mais poder para o Estado gerir a comunidade copta.

A violência estatal contra a religião se junta aos ataques aos fiéis. Em 2016, alguns episódios aterradores atingiram a comunidade copta. Em maio, uma mulher cristã de 70 anos cujo filho era "acusado" de ter uma relacionamento com uma muçulmana foi despida e arrastada pela rua de Minya.

No mês seguinte, famílias cristãs foram atacadas, um jardim da infância foi incendiado e um padre foi assassinado. Em julho, uma freira e um farmacêutico coptas foram assassinados. Em novembro, uma vila cristã foi atacada por uma gangue de 2 mil pessoas após a notícia de que uma residência funcionaria improvisadamente como templo religioso.

Todos esses episódios acirraram os ânimos da comunidade copta, que tem realizado inúmeros protestos contra o regime. Ocorre que o Egito tem hoje uma das ditaduras mais draconianas do mundo, que reprime a liberdade de expressão e reunião de maneira contumaz. O governo teme sua própria população e, dessa forma, os coptas, como o restante dos egípcios, têm poucas formas de manifestar sua indignação.

Há ainda dois agravantes importantes. O primeiro é que a cúpula da igreja copta é cada vez mais vista com suspeição pela própria comunidade. O papa Tawadros II é um ferrenho apoiador de Sissi, mas suas ações e declarações não escondem a clivagem existente entre o establishment religioso e a massa.

Sissi e Trump

Sissi e Trump
Sissi e Trump na Casa Branca em 3 de abril. Ao manter apoio a ditadores, o Ocidente patrocina o terror

O segundo complicador é a própria postura de Sissi. O ditador vende a si mesmo como um campeão do nacionalismo egípcio, protetor de muçulmanos e cristãos. Seus atos são, no entanto, meramente simbólicos. Sissi condena a violência contra os cristãos e, em janeiro de 2015, se tornou o primeiro presidente do Egito desde 1952 a participar da celebração do Natal copta, festejado em 7 de janeiro.

Na prática, seu regime continua incapaz de proteger os coptas, mantém a marginalização da comunidade e impede manifestações por mudanças. Sua "solução" para o ataque do Domingo de Ramos foi restabelecer o Estado de Emergência, que no Egito é sinônimo de ainda mais repressão contra toda a população.

De Washington, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que recebeu Sissi na Casa Branca na semana passada, condenou o ataque. E disse ter "grande confiança de que o presidente Sissi vai lidar com a situação corretamente". Não vai. Sissi continuará sendo um bastião do autoritarismo que, em combinação com invasões estrangeiras e com o radicalismo religioso, transforma o Oriente Médio em um caldeirão prestes a explodir, como comprova a existência do Estado Islâmico. É uma situação que penaliza a todos, especialmente os coptas.

O artigo original poderá ser visto por meio do link abaixo:


Que Deus tenha misericórdia de todos.

Alexandros Meimaridis

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